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Código de Ética, Artigo 41 
 

     ABS, 92 anos, sequelado de AVCs, em vida vegetativa. Nenhum prazer; é  alimentado por cateter nasogástrico. Está na UTI há três meses. Recebi o plantão com a decisão da traqueostomia a ser realizada na manhã seguinte. A conversa com a filha que autorizou o procedimento foi:

     - Ele está muito grave. Faremos todo o possível. Se não fizermos a traqueostomia, ele pode vir a apresentar outra pneumonia aspirativa.

     - Faça todo o possível, doutor.

     (Ninguém contestou: Grave? Como assim? Doutor, será que o sr. não vê que ele está no final de sua longa vida?)

     Naquele contexto de UTI, fiquei refém da situação. Chequei o coagulograma e fomos em frente.

     Saio do plantão e no dia seguinte atendo JCP, também com 92 anos, em estado bastante semelhante, mas em casa, cuidado pelas filhas. Depois de constatar a infecção respiratória, fiz as orientações cabíveis e conversamos sobre como seria seu fim de vida. Uma vela que se apaga por falta de pavio, a priorização do afeto, do conforto, da dignidade, a despedida, a perda.

     O caso da UTI é evidentemente mais complicado. Mais um paciente com prognóstico ominoso sendo tratado como se fosse voltar à  vida. Só faltou o colega dizer aos familiares: “Vocês querem que eu faça a traqueostomia? Vocês decidem, mas se ele morrer a culpa não é minha”. Quantas vezes fazemos o que não acreditamos, empurrados pela rotina, pela inércia... Como está introjetado em nós o conceito de manter a vida a qualquer custo! E os demais preceitos éticos? Aliviar o sofrimento, beneficência, não maleficência – totalmente cabíveis, mas nem sempre aplicados.

     Nosso novo Código de Ética, a vigir a partir de 14/04/10, reconhece no Artigo 41 o cuidado proporcional a ser oferecido ao paciente incurável e terminal e a inadequação do tratamento obstinado. Mas não basta haver um código. Com que critério eu defino que ABS ou JCP são pacientes com doença incurável e terminal? A maior parte das doenças que tratamos é incurável, crônica. E o momento na evolução a ser considerado terminal (prognóstico inferior a 6 meses) é muito discutível. Ou seja, nunca “passamos a bola” à equipe paliativista.

     Retrospectivamente conseguimos reconhecer que adentramos o campo das terapêuticas inúteis ou obstinadas e nos justificamos por nossa conduta ter sido decorrente de um desejo da família. Prospectivamente é mais difícil. Só com muita experiência, muito estudo, com sistematização dos cuidados desses casos. Investimento pleno no início, reavaliações programadas, suspensão das condutas inúteis. Para o Artigo 41 “pegar”, os médicos que lidam com pacientes terminais devem ter o necessário discernimento quanto ao momento de inverter as expectativas de sobrevida, priorizando o conforto, beneficiando os pacientes que sofrem no final da vida. Benvindo ao Código, Artigo 41. 
 

Roberto Schoueri Jr

(médico geriatra e intensivista e representante da APM no Comus) 

 
 
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